O Cubo - A metáfora da existência
Este comentário é uma análise (não intensiva) do filme e por isso pode conter spoilers.
Já alguma vez viram um filme que vos deixou a pensar sobre o que acabaram de ver? Porque eu já. Antes de mais, quero que saibam que não sou inteligente o suficiente para ter pensado nesta análise sozinha. Veio tudo de uma pesquisa demasiado elaborada para tentar acalmar o meu cérebro que só pensava num cubo enquanto queria dormir.
Filmes fáceis têm as suas vantagens. São de consumo leve, entretêm com comédia ou romance e não são chatos (grande parte das vezes). Este, acho que se percebe logo, não é um desses. No entanto, não quer dizer que mereça ser desvalorizado. É um filme muito alucinado e duro. Este sci-fi de terror canadiano tem várias características para nos levar à loucura. De facto, assim que o acabei só sabia que teria de ter uma mensagem profunda. Qual? Já vamos perceber melhor.
Como o nome indica, o filme passa-se num cubo (literalmente). Várias personagens encontram-se presas dentro dele sem saber como lá chegaram, tendo todos o mesmo uniforme vestido. A estrutura em si é composta por um misterioso número de salas em forma de (adivinhem) cubo e de diferentes cores. Algumas das salas têm armadilhas fatais difíceis de evitar, como nos apercebemos logo no prólogo: fogo, ácido, facas que vêm das paredes, etc. Para sobreviverem e conseguirem sair do labirinto cúbico terão de trabalhar em equipa.
Não só precisam uns dos outros como cada um tem um papel necessário para o grupo conseguir escapar. São sete pessoas que vemos nesta situação, só conhecemos ao pormenor seis. Um famoso fugitivo (de várias prisões), um polícia, uma psicóloga, uma estudante de matemática, um homem com deficiência mental e ainda o que fez o design exterior do cubo. Curiosamente, os nomes escolhidos para eles foram inspirados em prisões reais nos Estados Unidos, na Rússia, no Reino Unido e em França.
O tempo que passam presos leva-os aos limites das capacidades de racionalização. A maioria chega ao breaking point depois de horas sem comida nem água. O stress da situação faz com que se descontrolem, alucinem e façam teorias de conspiração sobre o porquê de terem ido lá parar. Vemos a mente humana a degradar-se lentamente, bem como as almas de cada um. Os espíritos vão mudando, podendo estar otimistas acerca da sua saída do cubo e passado uns minutos quase desistem de tudo.
Durante grande parte do início usavam a dica de Rennes, o famoso fugitivo, de atirar uma bota para uma sala enquanto noutra para ver se a próxima teria armadilhas. Quando este morre por ter achado que o caminho estava livre (a sala em questão tinha sensores de temperaturas humanas e, obviamente, não sinalizou com a bota), Leaven, a estudante de matemática, acaba por descobrir que os números nas portas são importantes. Se os números forem primos é porque a sala está armadilhada. Esta demonstra ser a maneira mais eficaz para passarem as salas.
Com ajuda do construtor do exterior descobrem que cada lado do cubo tem 26 salas, o que corresponde a um cubo com 17576 salas no total. Sempre que vão avançando e pensam que estão a ir bem há algo que lhes tira as esperanças. Quentin, o polícia, e Holloway, a psicóloga, chocam devido a Kazan, o rapaz autista. Nesta altura começa-se a perceber o egoísmo humano, principalmente. Vai-se degradando a ética e a moral, reinando a lei da sobrevivência.
O (ainda mais) especial deste filme é o seu significado, a verdadeira mensagem por detrás. Acaba por ser uma enorme metáfora da existência. Chegam àquele lugar sem saber como nem porquê, com apenas algumas memórias de momentos antes de serem levados para ali. Passam o tempo dentro do cubo a tentar responder a perguntas às quais não chegamos a receber resposta (nem quem está preso, nem quem assiste o filme). Nunca sabemos a razão de estarem ali ou sequer quem os raptou.
É uma mensagem muito subtil mas não é impossível de captar. Lá está, sou um bocadinho lenta. Com ajuda da poderosa Internet finalmente percebi e fiquei iluminada. Tive de ver o filme mais uma vez para o assistir completamente com novos olhos e valeu toda a pena.
O cubo é como se fosse a vida e a visão sobre a mesma, no filme, é muito pessimista. Worth, o designer do cubo, é quem demonstra mais esta faceta humana. Passa todo o tempo a dizer aos outros para evitarem procurar sentido onde ele não existe. Sabendo que o exterior foi feito de uma forma inquebrável, ele não tem esperanças de conseguir sair (desde o início).
O pessimismo não acaba aqui. De acordo com a filosofia do filme, a melhor parte da vida é escapar dela porque, para além disso, não há qualquer significado senão o acaso. A nossa existência não tem sentido e vivemos a vida presos a ela, ao sistema e à sociedade que nos impõe certas maneiras de a viver. Argumentam a vida como uma aleatoriedade, ignorando o que realmente lhe dá significado e motivação. Pode-se dizer que não concordo muito mas não significa que não aprecie a forma como transmitiram a mensagem.
A história mostra a parte má do mundo e da sociedade. O polícia simboliza a hipocrisia do sistema, das instituições. Tradicionalmente, ao pensarmos na autoridade, esperamos que nos proteja, que mantenha a calma. Ao contrário disto, Quentin descontrola-se, torna-se o mau da fita e percebemos que há muitas mais camadas (transtornadas) do seu ser.
Tal como a narrativa religiosa, o fim acaba por ser como a imagem que temos do que será a morte. Vemos Kazan, o rapaz autista, a ir em direção a uma luz. Ele tinha sido dos únicos sem pensamentos maliciosos e o mais inocente. Foi o que conseguiu chegar ao tal objetivo ou destino final. Não só é um excelente plot twist (a não ser que sejam daqueles que dizem "já sabia"), como nos faz repensar sobre a avaliação que fazemos das pessoas pelas suas competências cognitivas e físicas.
É uma história excelente para nos deixar a refletir sobre o filme (a produção em si) e sobre os aspetos da vida retratados. Quando nascemos chegamos ao mundo sem manual de instruções. Ninguém sabe verdadeiramente o que acontece antes (para existirmos) e depois (na morte). O significado da vida irá vir depois de se viver e experienciar. Se calhar era mesmo esse o objetivo do cubo dentro do mundo do filme, para relativizar a existência das personagens e as suas vidas "sem significado". Ficamos sem saber realmente o significado de tudo, tal como na vida. Preparem-se para muitos momentos de ansiedade e tensão. Não é, sem dúvida, para miúdos.
Adorei, fiquei com imensa vontade de ver o filme!
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