A Beleza de Normal People (Pessoas Normais)



    Normal People foi uma daquelas séries que comecei a ver por acaso. Não tinha qualquer expectativa e não sabia sequer do que se tratava. Ainda assim, dei por mim a vê-la num dia, a acabar às 3 da manhã e a olhar para o teto do quarto como se tivesse tido uma epifania. 

    Como muitos dos filmes e séries de que falo, é uma série de 12 episódios baseada num livro de Sally Rooney com o mesmo nome. Pode-se dizer que, depois desta experiência, foi parar à wishlistComeça tudo na adolescência, no início da peculiar amizade romântica entre dois jovens irlandeses. Connell e Marianne são pessoas que, à partida, se diria que são muito diferentes. Para além das diferenças em termos de classes sociais - a mãe de Connell trabalha na casa de Marianne a fazer limpezas -, há ainda em relação à popularidade. Contudo, são ambos estudantes muito inteligentes, com excelentes notas e que acabam por ir para a mesma Universidade, Trinity, em Dublin. 

Desde o início, a química entre eles é inegável, compreendem-se, apesar de tudo. A amizade vai crescendo cada vez mais com o decorrer do tempo e dos acontecimentos. São separados por más escolhas, mas reencontram-se meses mais tarde. Mesmo com afastamentos e novos namoros, não deixam de ter alguma presença na vida do outro ao longo da história. A amizade deles é muito poderosa. Atrever-me-ia a dizer que é o típico enredo de dois melhores amigos que levam anos a admitir os seus verdadeiros sentimentos. Mas é muito mais que isso.

    



  Retrata as várias fases de um relacionamento que, na minha opinião, é desnecessariamente complicado. Há muitas alturas frustrantes em que apetece gritar: "Fiquem juntos. Qual é a cena?". Contudo, há um leque de questões individuais que não os permitem estar como quereriam estar. Chega a ser confuso perceber o que realmente querem. No entanto, é o único defeito que assinalo ao conceito. Creio que amar não tem, nem deve, ser assim tão difícil. Muitas vezes contentamo-nos só porque julgamos que não merecemos melhor (como Marianne faz várias vezes), mas acredito que o amor verdadeiro e simples é muito mais gratificante. 

    Mesmo assim, é magnífica a forma como, subtilmente, falam sobre o interior do ser humano e os seus desejos emocionais mais básicos. O enredo conta-nos, realisticamente, a vida de pessoas normais e certos momentos que marcaram essas mesmas pessoas ao longo dos anos (que, de uma maneira ou outra, vão dar à outra pessoa). São, literalmente, Normal People. Com os seus medos, inseguranças, pensamentos, erros e defeitos. Como qualquer pessoa normal, julgam que não o são. São pessoas normais que querem amor, dar e receber. Não só amor de outros, de eles próprios também.





    É toda uma jornada através da nostalgia e depressão, onde as várias fases e idades se cruzam no trauma. Na verdade, toda a gente à volta dos dois principais parece ter algum tipo de trauma que os faz agir de certa forma. Qualquer pessoa normal está "estragada" de alguma maneira. Mas o amor que damos voluntariamente uns aos outros e a nós próprios salva-nos dessa avaria, pouco a pouco. Muda-nos a cada segundo e minuto que estamos com alguém em vez de outra pessoa, quase como uma evolução (nem sempre para melhor). É o veredito que consigo retirar. 

    Marianne tenta deixar para trás todo o sofrimento trazido pelos próprios familiares. Durante a maior parte dos episódios, toma decisões que nem sempre são as mais acertadas, só porque, a seu ver, era o que ela precisava e merecia. Connell ajuda-a. Aliás, ajudam-se um ao outro a perceber que merecem melhor. Não têm direito a menos do que amor e apoio, tanto de uma amizade como de um namoro ou outra ligação afetiva. A felicidade que trazem ao outro é incomensurável, são mais eles próprios quando estão juntos. E acho que todos já sentimos isso com alguém.




    Apesar de ser uma série cujas cenas são bastante calmas e silenciosas, mantemos o foco nas personagens. Não há espaço para distrações, deixam-nos dar a máxima atenção à história e aos diálogos que, por vezes, conseguem ser muito comoventes. A fotografia é lindíssima e esteticamente satisfatória. As imagens podem ser minimalistas mas atrativas. O soundtrack é quase inexistente, mas esquecemos a sua existência com o que nos apresentam aos olhos e ouvidos. O significado do silêncio entre diálogos e cenas acaba por falar mais alto. 

    Todo este ambiente transporta-nos para os momentos em questão, como se estivéssemos lá com eles. Os atores demonstram emoções tão fortes que até nós sentimos. Muitas cenas nem precisam de som, apenas uma troca de olhares ou respirações dão a entender toda a comunicação implícita.

    O ritmo é lento, ótimo para se ver a relaxar, devido à sua serenidade. A série traz muitas emoções ao de cima e pode até fazer-nos ficar com pele de galinha. De certeza que se irão identificar com alguma situação retratada. Mesmo se não acontecer, é impossível ficarem indiferentes. Apesar de tudo, e mesmo com o fim que tem (sim, preparem-se para uma viagem), não deixa de ser muito reconfortante. Depois de episódios sobre depressões, ansiedade, desilusões e desgostos, é importante não nos esquecermos das últimas palavras da série ditas por Marianne: "And we'll be okay" (e ficaremos bem). Porque somos pessoas normais. 




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